CÂNCER
PRECOCE NO ESTÔMAGO
Claudio
Lyoito Hashimoto
MédicoPesquisador da Disciplina de Gastroenterologia
da FMUSP
Médico do Serviço de Endoscopia Digestiva
do Hosp. Santa Cruz
|
H.
pylori
(scanning eletronic micrograph). |
INTRODUÇÃO
Apesar
da redução no número de casos
registrados em todas as partes do mundo, o câncer
de estômago (CE) ainda é a segunda maior
causa de óbito por câncer (1).
Altas
incidências são encontradas em países
da Ásia (Japão, China e Coréia
do Sul), no leste Europeu (Rússia) e na América
Latina (Costa Rica, Chile, Brasil) (1,2,3) (tabela
1). No Brasil, segundo o Instituto Nacional do Câncer
(INCA), o CE é uma das neoplasias de maior
incidência, no sexo masculino, nos estados do
Pará, Ceará e São Paulo. No sexo
feminino está entre as cinco neoplasias mais
freqüentes.
No Brasil, o CE é a maior causa de óbito
por neoplasia maligna em homens nas cidades de Belém
e Fortaleza e a segunda causa de morte em Campinas,
Porto Alegre e Goiânia (tabela 2). Entre as
mulheres, o CE é a terceira maior causa de
óbito por neoplasia, após o câncer
de colo uterino e de mama (5).
Tabela
1: Incidência do câncer de estômago
para a população mundial, por sexo.
Número de casos por 100.000 habitantes (adaptado
de "Annual Incidence of Gastric Cancer. International
Agency for Research on Cancer", 1993 e Instituto Nacional
do Câncer - INCA, Brasil, 1998).
REGIÃO |
MASCULINO |
FEMININO |
Japão |
75 |
35 |
Costa
Rica |
60 |
25 |
China |
55 |
23 |
Brasil
- Pará (Belém) / Norte
- Ceará (Fortaleza) / Nordeste
- SP (Campinas) / Sudeste
- Rio Grande do Sul (Porto Alegre) / Sul
- Goiás (Goiânia) / Central |
53,54
31,62
23,05
27,95
19,14 |
12,13
53,54
13,04
9,24
10,57 |
Rússia |
44 |
19 |
Inglaterra |
18 |
10 |
Estados
Unidos (negros) |
17 |
10 |
Estados
Unidos (brancos) |
10 |
8 |
Tabela
2: Taxa de mortalidade ajustada por idade por
100.000 habitantes. Ranking mundial de mortalidade
por GC. (Adaptado de Muir et al., 1995 e Instituto
Nacional do Câncer - INCA, Brasil, 1998).
REGIÃO |
HOMENS |
MULHERES |
Ranking |
Taxa |
Ranking |
Taxa |
Coréia |
1 |
54,6 |
1 |
23,7 |
Costa
Rica |
2 |
49,9 |
2 |
23,1 |
Rússia |
3 |
38,4 |
3 |
16,5 |
Japão |
4 |
37,9 |
4 |
17,2 |
Chile |
5 |
34,8 |
5 |
14,1 |
China |
6 |
31,2 |
6 |
15,6 |
Brasil
- Belém (Pará) - 89
- Fortaleza (Ceará) - 85
- Campinas (São Paulo) - 92
- Porto Alegre (Rio Grande do Sul) - 91
- Goiânia (Goiás) - 91 |
1*
1*
2*
2*
2* |
29,82
23,35
19,17
17,77
12,53 |
2*
3*
3*
4*
3* |
9,21
7,44
6,66
6,48
5,58 |
Inglaterra |
26 |
13,8 |
33 |
5,6 |
Estados
Unidos |
49 |
5,3 |
50 |
2,3 |
*
Em comparação a outras neoplasias
malignas no Brasil. |
Convém
lembrar que apesar dos progressos na área cirúrgica
e oncológica, a taxa de cura do CE pouco se
alterou nos últimos 40 anos e a taxa de sobrevida
em 5 anos permanece em torno de 15%. A reduzida taxa
de sobrevida deve-se, provavelmente, ao fato de que
a maioria dos casos são diagnosticados já
em fase avançada. Nestas condições,
é sabido que 80% dos pacientes submetidos à
gastrectomia curativa apresentam recorrência
local e/ou à distância (3). É
importante relatar, no entanto, que existem grandes
diferenças nos resultados do tratamento entre
diferentes países. A taxa de sobrevida observada
no Japão é muito maior que em comparação
a outros países, possivelmente devido ao maior
número de CE diagnosticados em fase precoce
(6,7,9,10).
DEFINIÇÃO
DE CÂNCER PRECOCE DO ESTÔMAGO
O
câncer precoce do estômago (CPE)
foi definido no Japão em 1962, durante o Encontro
da Sociedade Japonesa para Pesquisa do Câncer
Gástrico. É o câncer cuja invasão
está limitada à camada mucosa ou à
submucosa, sem levar em conta a presença de
metástases para linfonodos (6). Dentre as variáveis
mais importantes relacionadas ao prognóstico
do CE, os fatores considerados são a profundidade
de invasão tumoral e a presença de metástases
linfonodais (6,7) Gráfico 1. Deve-se salientar
que o termo "precoce" não faz referência
ao tamanho, nem à duração e tempo
ou o estágio na gênese da neoplasia maligna,
mas ao câncer potencialmente curável
(6,7,9).
IMPORTÂNCIA
DO CÂNCER PRECOCE DO ESTÔMAGO
O
prognóstico dos pacientes com CPE é
muito melhor em comparação àqueles
com lesões avançadas, fato constatado não
apenas no Japão, mas também na Inglaterra,
na Alemanha e na Itália (8,9,10). Segundo dados
da década de 80 do National Cancer Center Hospital
de Tóquio, Japão, 53% dos pacientes
com CE operados apresentavam invasão tumoral
limitada à camada mucosa e/ou submucosa. Os
pacientes com CPE apresentaram taxa de sobrevida de
80 a 90% em 5 anos (4,6,22,23,24), Gráfico
1. Taxa de sobrevida em 5 anos do câncer de
estômago conforme a profundidade de invasão
e a presença de metástases linfonodais
(níveis 0, 1, 2 , 3 e 4)
Segmento
/ anos |
|
Segmento
/ anos |
No
ocidente, cerca de 7 a 15% dos casos de CE são
diagnosticados em fase precoce (8,12,21). A experiência
do Hospital de Clínicas da Universidade de
São Paulo relatada por Gama-Rodrigues et al.1995,
no período correspondente de 1974 a 1991, 13,8%
dos CE tratados foram precoces (21). A grande diferença
no diagnóstico do CPE é provavelmente
um dos fatores mais importantes na diferença
de sobrevida registrada entre o ocidente (15% - 5
anos) e o Japão (70% - 5 anos) (12,22).
QUADRO
CLÍNICO
Estudos
têm demonstrado que o CE ocorre com maior freqüência
em indivíduos na sétima década,
do sexo masculino, na relação 2:1 em
comparação ao sexo feminino. O CPE,
por outro lado, ocorre em menor faixa etária,
geralmente na quinta e sexta décadas de vida.
Este fato levou os pesquisadores a estudarem o tipo
e a freqüência de sintomas no CE. Os principais
sintomas dos pacientes com CE avançado (invasão
tumoral além da muscular própria) foram
anorexia, perda de peso, anemia e astenia intensa.
O
CPE, ao contrário de estudos prévios,
apresenta algum tipo de sintoma em 60 a 90 % dos casos
(16,17). Fielding et al., de Birmingham, Inglaterra,
avaliaram retrospectivamente 13.228 casos de CE. Deste
total havia 90 casos de CPE, e todos apresentavam
sintomas dispépticos (10). Na experiência
de Green et al., da Universidade de Columbia, Nova
York, 82% dos pacientes com CPE apresentavam sintomas
dispépticos (13). Segundo Eckardt et al., a
queixa de dispepsia dos pacientes com CPE foi semelhante
à das apresentadas pelos pacientes com doença
péptica benigna. Os pacientes com CE avançado,
por outro lado, apresentaram como sintoma predominante
emagrecimento e anorexia (14).
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