DOENÇA
INFLAMATÓRIA INTESTINAL RCUI OU DOENÇA
DE CROHN? DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Dra.
Claudia P.M.S. de Oliveira
Médica pesquisadora da Disciplina de Gastroenterologia
da FMUSP
O
termo Doença Inflamatória Intestinal
(DII) engloba a Retocolite Ulcerativa Idiopática
(RCUI) e a doença de Crohn (DC). Estas doenças,
apesar de distintas em alguns aspectos clínicos,
endoscópicos e radiológicos, são
estudadas concomitantemente em um mesmo capítulo
(DII) por apresentam algumas características
genéticas, epidemiológicas e imunológicas
semelhantes e principalmente, por apresentarem em
comum um processo inflamatório crônico
intestinal.
Contudo,
apesar de estudadas em um mesmo capítulo, a
RCUI e a DC têm diferenças importantes
na sua forma de apresentação. Estas
diferenças se iniciam pelo comprometimento
difuso da DC, podendo acometer todo o trato digestivo,
da boca até o ânus, enquanto que a RCUI
limita-se ao colon.
Algumas
características histopatológicas tanto
macroscópicas como microscópicas são
diferentes na DC e RCUI. Na doença de Crohn
a inflamação é transmural ou
seja acomete toda a parede intestinal e, o comprometimento
é descontínuo(áreas sem alterações
entremeadas à áreas comprometidas).
Nesta doença, são comuns úlceras
lineares confluentes, profundas, fístulas e
estenoses. O granuloma focal não caseoso no
intestino delgado, é encontrado em 30-40% dos
pacientes com DC e a presença de abcesso de
cripta é indicativo de RCUI.
Na
RCUI, a inflamação é delimitada
à mucosa e submucosa do cólon e o comprometimento
é contínuo, iniciando-se pela parte
distal do reto. Não são freqüentes a
presença de estenoses e fístulas e,
a mucosa colônica é friável devido,
à ulceração superficial difusa.
Pode coexistir a formação de pseudopólipos,
que consistem em afloramentos de tecido de granulação
que surge entre as áreas de inflamação.
É freqüente a presença de abscessos
de cripta, e, praticamente não se encontram
granulomas focais. A displasia do cólon é
mais freqüente do que na DC.
Diferenças
clínicas também são vistas entre
as duas doenças, principalmente, partindo-se
do princípio que a DC pode acometer todo o
trato gastrointestinal, podendo cursar com uma grande
variabilidade de apresentação clínica,
sendo que a RCUI é exclusiva do cólon.
Na
DC a dor abdominal é mais frequente e se localiza
em região periumbilical e fossa ilíaca
direita pois, o principal local de acometimento é
a região íleo-cecal. Na RCUI a dor é
menos intensa e frequentemente se localiza nos flancos
e fossa ilíaca esquerda. O sangramento retal
é bem mais comum na RCUI, encontrado na DC
quando haja comprometimento importante do cólon.
Massa
palpável no abdome é mais encontrada
na DC, localizada frequentemente na fossa ilíaca
direita (região íleo-cecal), sendo rara
na RCUI. Sintomas gerais como mal estar, febre, perda
ponderal e anorexia são mais evidentes na DC
do que na RCUI. Diarréia crônica, líquida,
sem sangue ou pus constitui um dos sintomas que levam
o médico a pensar no diagnóstico de
DC.
A
presença de fístulas perianais, enterocutâneas
ou entero-entéricas também devem suscitar
diagnóstico de DC, sendo raras na RCUI. Quadros
suboclusivos são mais frequentes na DC e o
megacólon tóxico mais comum na RCUI.
Sintomas retais como puxo, tenesmo e urgência
fecal são mais evidentes na RCUI.
Endoscopicamente,
também existem algumas peculiaridades inerentes
a cada uma, apesar de algumas vezes, o diagnóstico
diferencial apresentar-se difícil. Na DC, o
comprometimento retal é incomum, as lesões
colônicas quando existentes, se apresentam sob
a forma de úlceras denominadas aftóides,
que são úlceras rasas, esbranquiçadas,
de margens elevadas (são bolhas rotas).
Também
existe a presença de úlceras lineares
e serpinginosas que podem coalescer e formar fissuras
profundas. Aspecto característico no íleo
terminal é aquele denominado "cobblestone's"
ou aspecto em "pedras de calçamento", que é
resultado de fissuras e úlceras cercando áreas
de mucosa normal; o aspecto em cordel, próprio
de estenose inflamatória, é igualmente
típico .
Na
RCUI, o reto sempre se encontra lesado e o comprometimento
é contínuo, não existindo áreas
de mucosa normal com mucosa lesada como na DC. A mucosa
é mais friável e sangra ao toque do
endoscópio. Pode existir a presença
de pseudopólipos em todo trajeto do colon.
Estas diferenças auxiliam fortemente no diagnóstico
diferencial entre a RCUI e DC. Contudo, em uma percentagem
de 5-10%, apesar da tentativa de se diferenciar clínica,
endoscópica e histopatologicamente, não
se consegue diferenciar entre DC e RCUI, principalmente
quando o comprometimento é exclusivo do cólon.
Denomina-se para estes casos colite indeterminada
.
O
quadro abaixo sumaria dados comparativos entre RCUI
e DC.
Quadro
1. Diferenças Anátomo-Clinicas entre
RCUI e DC
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RCUI
|
DC
|
Aspectos
Macroscópicos
|
Comprometimento
exclusivo do cólon.
Envolvimento retal frequente. Lesões
contínuas.
Úlceras superficiais.
Friabilidade da mucosa.
Presença de pseudopólipos.
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Comprometimento
da boca ao ânus.
Lesões orificiais (anus).
Lesões segmentares.
Úlceras profundas.
Friabilidade menos evidente. Aspecto em mosaico.
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Aspectos
Microscópicos
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Inflamação
restrita à mucosa e submucosa.
Abscessos de cripta frequentes. Depleção
das células. caliciformes.
Atrofia da mucosa.
Ausência de granulomas.
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Inflamação
transmural.
Abcessos de cripta infreqüentes.
Rara depleção de células
caliciformes.
Mucosa sem atrofia Granulomas frequentes.
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Aspectos
Clínicos
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Dor
no flanco e fossa ilíaca D.
Sangramento retal frequente.
Diarréia semilíquido com sangue.
Náusea e vômitos raros.
Tenesmo e puxo frequentes.
Mal estar, febre, anorexia menos comuns.
Fístulas e estenoses incomuns
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Dor
periumbilical e fossa ilíaca D. Sangramento
retal infreqüente. Diarréia líquida
sem sangue. Náusea e vômitos mais
frequentes. Tenesmo e puxo raros.
Presença de mal estar, febre e anorexia.
Fístulas e estenoses comuns .
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