ENDOSCOPIA
EM AÇÃO
Paulo
Sakai
Livre-Docente do Departamento de Gastroenterologia da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
TRATAMENTO
ENDOSCÓPICO DAS VARIZES HEMORRÁGICAS DO ESÔFAGO: ESCLEROTERAPIA
OU LIGADURA ELÁSTICA ?
Apesar
do progresso no conhecimento da fisiopatologia e formas de controle
da hemorragia por ruptura das varizes esofágicas, não há ainda método
terapêutico ideal. Contudo, o método endoscópico através da escleroterapia
e ligadura elástica das varizes tem sido o mais aceito, tanto na fase
aguda da hemorragia quanto na fase eletiva. O controle da hemorragia
e a prevenção das recidivas são os fatores fundamentais que têm modificado
a história natural das varizes esofágicas sangrantes, proporcionando
significativo aumento do período sem recidiva hemorrágica, conforme
demonstram estudos controlados realizados em pacientes cirróticos ou
com esquistossomose.
O
método endoscópico não consegue controlar a hemorragia aguda ou as recidivas
posteriores em aproximadamente 10% dos casos, nos quais está indicado
o tratamento cirúrgico ou a derivação pelo TIPS.
Uma
alternativa terapêutica nos pacientes cirróticos descompensados é a
obliteração das varizes com a injeção do adesivo tissular, cianoacrilato,
preconizado por Soehendra (1986). Esta substância é injetada por via
endoscópica e é utilizada também com sucesso no tratamento das varizes
de fundo gástrico.
O
transplante hepático é considerado atualmente uma alternativa terapêutica
definitiva para os cirróticos e o tratamento endoscópico tem importante
função neste contexto.
ESCLEROTERAPIA
DAS VARIZES ESOFÁGICAS
Após
a primeira sessão de escleroterapia, cerca de 30% dos pacientes apresentam
recidiva hemorrágica na fase precoce de 24 a 72 horas. Nesta situação
está indicada a repetição da escleroterapia ou a colocação de um balão
esofágico, que será insuflado por um período de 6 a 12 horas e, ao ser
desinsuflado procede-se a complementação imediata da escleroterapia.
Aproximadamente
10 a 20% dos pacientes são refratários ao controle da hemorragia pela
escleroterapia, e a estes pacientes está reservada a opção cirúrgica
de emergência. Atualmente, observa-se a tendência favorável ao procedimento
menos invasivo e, quando for disponível, a derivação portossistêmica
intra-hepática transjugular (TIPS) é a opção de preferência. A repetição
das sessões de escleroterapia é necessária com o intuito de se erradicar
completamente as varizes.
O estudo prospectivo
realizado no nosso Serviço em 149 pacientes, sendo 78 portadores de
esquistossomose e 71 com cirrose, e com seguimento de 67 ~ 91 meses
demonstrou: 1) controle da recidiva hemorrágica em 93% dos pacientes
esquistossomóticos e 67% nos cirróticos; 2) sobrevida de 92,6% no primeiro
grupo de pacientes e 28,3% nos cirróticos no período de seguimento;
3) a reserva hepática funcional foi fator fundamental no controle definitivo
da recidiva hemorrágica. As complicações mais freqüentes em ambos os
grupos foram: dor retroesternal (60%), odinofagia e disfagia (55%) e
febre (28%). Estas complicações não apresentaram diferença estatisticamente
significativa entre ambos os grupos e foram tratadas sintomaticamente,
apresentando resolução espontânea em 24 ~ 48 horas. A reserva hepática
funcional demonstrou ser fator fundamental nos resultados da escleroterapia
no controle definitivo da recidiva hemorrágica. Assim, o controle foi
possível em 88% dos pacientes cirróticos classificados como Child A.,
em contraposição aos 47% obtidos com pacientes Child C. Os resultados,
expressivamente piores em pacientes com grau avançado de insuficiência
hepatocelular, possivelmente indicam falha dos mecanismos de coagulação
e cicatrização, fundamentais na obliteração das varizes esofágicas.
Os pacientes com esquistossomose, por não terem apresentado insuficiência
hepática e outras complicações graves, se beneficiaram de maneira plena
com o tratamento.
LIGADURA
ELÁSTICA DAS VARIZES ESOFÁGICAS
A ligadura elástica
das varizes esofágicas é um método de tratamento endoscópico, introduzido
por Stiegmann e cols. (1986). O método é baseado nos princípios da ligadura
elástica de hemorróidas, sendo as varizes aspiradas para dentro de um
adaptador na extremidade do endoscópio e em seguida ligada com um pequeno
anel elástico acondicionado num cilindro que o libera ao ser tracionado.
Os resultados da
pesquisa multicêntrica com este método não apresentam diferença estatisticamente
significante com a escleroterapia, quando se compara o índice de erradicação
das varizes, recidiva hemorrágica e número de sessões dos procedimentos.
Entretanto, quando se compara o item complicações, a incidência é significativamente
maior no grupo de escleroterapia. Este aspecto tem sido o consenso geral
com este método na literatura e na experiência do nosso Serviço.
O método de ligadura
é uma alternativa à escleroterapia com grande aceitação neste momento,
em vista da simplicidade, eficácia e baixa morbidade. Com a introdução
no mercado de dispositivos que permitem ligaduras múltiplas de 4 a 10,
o método se tornou mais prático. Assim, este método tem sido de nossa
preferência no tratamento das varizes esofágicas na fase não hemorrágica
e, também, durante a hemorragia ativa desde que as condições de visibilidade
do campo permitam.
As ulcerações ocorrem
sistematicamente em todas as ligaduras depois da queda do elástico na
primeira semana; elas são superficiais e mais extensas, comparadas com
as ulcerações pós-escleroterapia. Nesta situação, a hemorragia pode
ocorrer, principalmente, em pacientes com cirrose descompensada por
alteração nos fatores de coagulação. Outras complicações relacionadas
com a ligadura elástica referem-se a disfagia por impactação de alimentos
sólidos e soltura precoce das bandas elásticas. As solturas podem ocorrer
com freqüência com as ligaduras sobre varizes previamente tratadas através
da escleroterapia.
ESCLEROTERAPIA
OU LIGADURA ELÁSTICA?
Na realidade, ambos
os métodos são efetivos na erradicação das varizes esofágicas, embora
com maior índice de complicações com a escleroterapia. Entretanto, no
seguimento a longo prazo, tem-se observado recidiva mais freqüente das
varizes esofágicas no grupo dos pacientes tratados com ligadura elástica.
Este fato é explicado pela existência das veias perfurantes, que comunicam
as veias paraesofágicas com a rede venosa submucosa. Com a escleroterapia,
as veias perfurantes são também esclerosadas durante a injeção intravaricosa
do esclerosante. Este fenômeno não ocorre com a ligadura elástica, porquanto
o intuito é a erradicação das varizes no nível da mucosa.
A nossa preferência
é o emprego de rotina de ambos os métodos, com a denominação de tratamento
combinado. Isto é: iniciamos o tratamento com a ligadura elástica, e
após 2 a 3 sessões em intervalos de 10 a 14 dias, complementamos com
a escleroterapia. As varizes remanescentes pós ligadura elástica apresentam-se
em segmentos curtos entre as ligaduras ou em forma de varizes finas,
e são erradicadas de forma mais efetiva com a escleroterapia.
Portanto, no nosso
Serviço a escleroterapia e a ligadura elástica continuam sendo usadas
de forma combinada, um método complementando o outro.
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