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Revista de Gastroenterologia da Fugesp - DIARRÉIAS I: GENERALIDADES
Nov/Dez-2000

DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO
Dr. Antonio A. Laudanna
Prof. Titular de Gastroenterologia da FMUSP
Dra. Claudia P. M. S. de Oliveira

A Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE) é uma das afecções mais comuns na prática gastroenterológica. Contudo sua real prevalência não é conhecida, visto que grande parte dos refluidores não consulta o médico e se automedica indiscriminadamente com antiácidos.

Há dez anos atrás, a DRGE era denominada Esofagite de Refluxo (ER), denominação esta que só exprimia a conseqüência do RGE. Já o termo atual, DRGE, é mais apropriado, pois menciona não só a conseqência, esofagite, como também a característica fisiopatológica da doença.

Fisiopatologicamente, a DRGE ocorre quando existe um desequilíbrio entre os fatores agressivos e defensivos da mucosa esofágica. Entre os fatores agressivos incluem-se a presença do ácido clorídrico, da pepsina e da secreção bilio-pancreática. Entre os defensivos, estão todos os mecanismos anatômicos e funcionais que impedem que haja refluxo gastroesofágico patológico. Os anatômicos são: pinçamento do diafragma crural direito e anel diafragmático; o ângulo agudo de entrada do esôfago no estômago; ligamento frenoesofágico e a roseta de mucosa gástrica. Os funcionais são representados pela pressão do esfíncter inferior do esôfago; o clareamento esofágico; resistência epitelial e o esvaziamento gástrico.

Dentre estes fatores, um dos principais envolvidos na fisiopatogênese do RGE é a hipotensão do esfíncter esofágico inferior (EEI), que por vezes se mantém aberto, facilitando a entrada de ácido por tempo prolongado no esôfago. Ressalte-se que, normalmente, existe um refluxo gastroesofágico fisiológico que é de curta duração e geralmente ocorre após as refeições.

Doenças do tecido conectivo (esclerodermia), drogas bloqueadoras dos canais de cálcio e anticoncepcionais, entre outros, reduzem a pressão do EEI, favorecendo o refluxo. Contudo, outros fatores tais como o retardo do esvaziamento gástrico, alterações no clareamento esofágico, presença de hérnia hiatal e obesidade contribuem para que haja REG patológico.

O diagnóstico desta afecção se baseia no quadro clínico e exames complementares. As manifestações clínicas da DRGE podem ser classificadas em típicas, atípicas ou conseqüentes a complicações. Dentre as manifestações típicas encontram-se a pirose retroesternal que sugere fortemente a presença do refluxo, a regurgitação e a sialorréia. Também podem acompanhar o quadro sintomas dispépticos como plenitude pós-prandial, desconforto epigástrico, eructações e náuseas.

As manifestações atípicas são representadas pela dor torácica de origem não cardíaca, geralmente confundida com coronariopatia, a qual deve ser sempre excluída; tosse crônica; pigarro; rouquidão; sinusite crônica; broncoespasmo e Globus Histericus na "garganta".

Dentre as manifestações de alarme que podem sugerir complicações e doença grave encontram-se: a hemorragia digestiva, a disfagia que pode sugerir estenose, sintomas de mediastinite que podem sugerir perfuração, anemia por perda crônica de ferro e possivelmente o esôfago de Barrett, que merece atenção especial por predispor ao aparecimento de adenocarcinoma de esôfago.

O esôfago de Barrett é definido como a substituição do epitélio escamoso do esôfago por epitélio colunar. Pode ocorrer metaplasia intestinal.

O diagnóstico da DRGE típica é eminentemente clínico. Contudo, exames complementares são necessários não só para ratificar o diagnóstico, mas também para avaliar as conseqüências do refluxo e diagnosticar complicações e manifestações atípicas.

O exame endoscópico é de fundamental importância, pois permite avaliar as conseqüências da DRGE, assim como as complicações. E quando associado à biópsia esofágica, aumenta sua sensibilidade.

O exame radiológico contrastado do esôfago (EED) é útil quando o paciente refere disfagia, pois permite avaliar sob o ponto de vista estrutural do órgão uma eventual estenose.

O método cintilográfico é utilizado para pesquisar a presença ou ausência de refluxo. Todavia, sua sensibilidade é baixa. Torna-se útil e bem tolerado na investigação de refluxo em crianças, evitando-se, tanto quanto possível, a endoscopia e pHmetria de 24 horas.

A pHmetria de 24 horas é sem dúvida o padrão ouro para se evidenciar a presença de refluxo patológico. Permite quantificar a intensidade da exposição da mucosa esofágica ao ácido. Caracteriza o RGE patológico, o pH esofágico abaixo de 4 por tempo significante durante a prova.

Deve ser indicado para pacientes com manifestações atípicas e pacientes com sintomas típicos com endoscopia normal.

A manometria esofágica está indicada principalmente no pré-operatório de pacientes, em que se pretende realizar procedimento cirúrgico para avaliar a condição pressórica do esfíncter esofágico inferior, fato este que é relevante na cirurgia anti-refluxo.

O tratamento clínico baseia-se em medidas comportamentais e farmacológicas. Entre as medidas comportamentais inclui-se a elevação da cabeceira da cama (recomenda-se elevar com suportes a cabeceira da cama em 15 cm); evitar a ingestão de alimentos gordurosos, cítricos, que contenham cafeína, bebidas alcoólicas e gasosas, cigarro, chocolate e hortelã; não deitar logo após as refeições; reduzir o peso corporal; evitar drogas como bloqueadores de canais de cálcio, teofilina, alendronato e anticolinérgicos.

O tratamento farmacológico consiste na utilização de substâncias que bloqueiam a produção de ácido, associado a drogas pró-cinéticas que melhoram o esvaziamento gástrico e aumentam a pressão do EEI.
As mais utilizadas para bloqueio da secreção ácida são os inibidores de bomba protônica (omeprazol, lanzoprazol ou pantoprazol) e bloqueadores H2 (ranitidina), estes últimos na dose mínima de 300mg/dia.

Entre as drogas pró-cinéticas, as mais utilizadas são a bromoprida e a domperidona.

Tem-se afastado entre os pró-cinéticos a cisaprida, que já apresentou graves complicações cardíacas.

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