CONSIDERAÇÕES
GERAIS
Doença
Celíaca (DC) pode ser definida como uma importante
afecção do intestino delgado conseqüente
a permanente intolerância ao glúten.
Esta
entidade foi descrita pela primeira vez por
Areteus, no primeiro século da era
de Cristo, quando descreveu o caráter crônico
da doença e aspecto característico
das fezes (aspecto esteatorréico). Também
observou ser uma doença que comprometia mais
mulheres e crianças. Desde então,
vários pesquisadores iniciaram o estudo desta
afecção e, em 1950, Dicke demonstrou
que a retirada do glúten da dieta fazia desaparecer
a sintomatologia.
A
Doença Celíaca acomete indivíduos
de ambos os sexos, principalmente da raça
branca, podendo manifestar-se tanto na infância
como na vida adulta.
Possui
um amplo espectro de apresentação
clínica, variando desde pacientes assintomáticos
até a forma clássica de má
absorção.
INCIDÊNCIA
- GENÉTICA - PATOGÊNESE
É
uma das causas mais freqüentes de má absorção
na infância.
Apresenta
uma incidência maior na raça
branca, principalmente em países europeus
como a Irlanda e Suécia, onde tem uma prevalência
de 1:300 e 1:400. Sua alta prevalência nestes
países deve-se à origem genética
da doença.
Existe
uma maior associação da Doença
Celíaca em indivíduos que têm
antígenos de histocompatibilidade
(HLA) do haplótipo HLA B8-DR3 e
DQ2, antígenos estes também
relacionados a outras doenças imunológicas.
Existem
duas principais teorias implicadas na fisiopatogênese
da Doença Celíaca:
A
biópsia intestinal continua sendo
o padrão ouro para diagnóstico da
DC.
As
alterações histológicas características
surgem em tempo variável de indivíduo
para indivíduo. Quando presentes, já
na criança, surgem em torno de 6-8 meses
de idade (quando têm início as papinhas).
Na
DC o segmento do intestino delgado mais afetado
é o proximal, principalmente jejuno alto.
O grau de acometimento decresce à medida
em que se aproxima do íleo terminal. Este
fato pode ser explicado, provavelmente porque as
frações tóxicas do glúten
são inativadas ao longo da luz entérica
pelas proteases, antes de chegar no íleo
terminal.
A
lesão histológica típica
da DC é atrofia total ou subtotal
das vilosidades intestinais e hipertrofia de
criptas. Outras alterações, como redução
da altura dos enterócitos, aumento dos linfócitos
intraepiteliais e infiltrado inflamatório
predominantemente linfoplasmocitário na lâmina
própria fazem parte do quadro.
MANIFESTAÇÕES
CLÍNICAS
Existe
uma grande variabilidade de apresentação
clínica, assim como a idade em que se iniciam
os sintomas. Existe um período de latência
variável entre o início da ingestão
do glúten e o surgimento dos sintomas.
A
proporção de pacientes com DC apresentando
sintomas e sinais clássicos de má
absorção tem sido estimada em 30-40%
de todos os pacientes que têm intolerância
ao glúten. Assim, menos da metade
dos pacientes com DC terão o quadro
clínico clássico de má absorção.
Contudo, toda má absorção deve
ter no diagnóstico etiológico a DC
como uma das principais causas.
Os
sinais e sintomas clássicos de má
absorção consistem em diarréia
crônica com fezes de aspecto esteatorréico
(volumosas, brilhantes, fétidas, coloração
amarelo-claras ou acinzentadas, que "bóiam"
no vaso, tendo uma freqüência de 1-5 evacuações
diárias), desnutrição, edema
de membros inferiores, palidez cutâneo-mucosa.
Geralmente, os pacientes com este quadro apresentam
abdome volumoso, distendido e referem anorexia e
perda de peso acentuada.
Outros
sinais e sintomas não tão característicos
podem indicar Doença Celíaca, como:
anemia crônica inexplicável,
retardo no crescimento e baixa estatura,
distensão abdominal como único
sintoma, fadiga crônica,
estomatites, úlceras aftóides.
Amenorréia, infertilidade,
dores ósseas e parestesias
também podem ser sinais indiretos
de má absorção e de DC.
Existem
algumas doenças imunológicas que se
associam à DC, como: doença
autoimune tipo I, anemia hemolítica
autoimune, púrpura trombocitopênica
autoimune, polimiosite, dermatite
herpetiforme, entre outras.
Como
vemos, existe uma grande variabilidade de apresentação
clínica, desde pacientes assintomáticos
até pacientes com quadro severo de má
absorção. O importante é enfatizar
que em todo paciente com quadro de má absorção,
seja criança ou adulto, devemos incluir a
Doença Celíaca no diagnóstico
diferencial das síndromes de má absorção.
DIAGNÓSTICO
Além
do diagnóstico clínico de má
absorção, alguns exames complementares
ratificam o diagnóstico da síndrome
de má absorção, particularmente
da Doença Celíaca. Os principais exames
que devem ser solicitados diante do quadro de má
absorção são:
1)
Dosagem de gordura fecal
2)
Prova da D-xilose
3)
Estudo radiológico contrastado do intestino
delgado
4)
Biópsia jejunal
5)
Outros exames que avaliam as condições
gerais, principalmente relacionadas à desnutrição:
hemograma, proteinograma, ionograma, ferro sérico,
etc.
A
dosagem de gordura nas fezes determina o teor de
gordura nas fezes de 24 horas. Pela técnica
de Van der Kammer, o paciente faz uma dieta com
100 gramas de gordura por 3 dias seguidos e, a partir
do terceiro dia inicia-se a coleta de fezes até
completar 72 horas. O valor de excreção
normal é de até 6 gramas de gordura
nas 24 horas. Acima deste valor considera-se esteatorréia.
A
prova da D-xilose baseia-se na absorção
de açúcares como a xilose, através
da determinação da xilosemia após
1 hora da ingestão desta pentosa. Geralmente
administram-se 25 gramas de xilose por via oral
e quantifica-se a xilosemia 1 hora depois.
Indivíduos normais apresentam xilosemia maior
que 20 mg/dl na primeira hora. Em 80% dos pacientes
com DC sem tratamento, a xilosemia é menor
que 20 mg/dl.
A
excreção da D-xilose medida na urina
de 24 horas, no indivíduo normal, é
da ordem de 25% da dose administrada (25 g).
A morfologia do delgado, avaliada através
do RX, pode mostrar "padrão" radiográfico
de má absorção: espessamento
das pregas mucosas, "hipotonia" das alças
e floculação do bário.
A
biópsia jejunal constitui o padrão
ouro para o diagnóstico da Doença
Celíaca. Pode ser realizada por meio
de endoscopia digestiva alta, de preferência
através da enteroscopia, pois quanto mais
próximo do jejuno, maior é a sensibilidade
do método. Outro método que vem sendo
substituído consiste na utilização
de cápsulas próprias para biópsia
do delgado, deflagradas quando atingem o ângulo
de Treitz.
A biópsia jejunal, a prova terapêutica
da retirada do glúten com melhora da
sintomatologia clínica e altos títulos
de anticorpos antigliadina, antireticulina
ou antiendomísio, constituem os
principais critérios diagnósticos
preconizados pela Sociedade Européia de Gastroenterologia
Pediátrica e Nutrição (ESPGAN).
TRATAMENTO
Exclui-se
o glúten da dieta por toda vida, retirando-se
alimentos que contenham gliadina, representados
pelo trigo, cevada, centeio e aveia. Deve-se
chamar a atenção para alimentos que
possam estar "contaminados" pelo glúten,
café solúvel, enlatados de modo geral,
lingüiça, salames e presunto. As rotulações
atuais dos produtos de qualidade trazem informação
sobre a existência ou não de glúten.
Inicialmente,
após exclusão do glúten
da dieta, pode-se acrescentar ácido fólico,
vitamina B12 e ferro para
restaurar mais rapidamente os níveis hematológicos.
Às vezes existe a necessidade de reposição
de vitamina D e cálcio, pois alguns pacientes
desenvolvem osteomalácia, hipocalcemia e
inclusive tetania.
O
prognóstico é bom na maioria dos pacientes
que respeitam a dieta sem glúten. Na infância
e, principalmente na adolescência, geralmente
ocorrem transgressões da dieta, com reaparecimento
dos sintomas. Cabe ao médico orientar bem
os pacientes e os pais dos pacientes jovens, alertando
para as conseqüências da transgressão
alimentar.
Os
pacientes com DC parecem ter uma predisposição
maior para o aparecimento de neoplasias, principalmente
Linfomas, que a população geral. Há
regressão manifesta do quadro histológico
à biópsia do delgado, com pronunciada
tendência à normalização
que, no mais das vezes não chega a ser inteiramente
completa.
Responda
às perguntas
1)
O que são fezes esteatorréicas e quais
são as suas características à
macroscopia?
2)
Qual o principal exame para diagnóstico da
Doença Celíaca?
3)
Qual a principal medida terapêutica para os
pacientes Celíacos?
4)
Qual a correlação entre DC e antígenos
de histocompatibilidade HLA?
5)
Que pesquisas de anticorpos são importantes
na etapa diagnóstica?