Colestase
é uma síndrome clínica caracterizada
pela diminuição do fluxo biliar e
que pode ser causada por diferentes doenças
intra e extra-hepáticas. Colestase extra-hepática
resulta da obstrução de ductos biliares
de maior calibre fora do fígado, enquanto
que colestase intra-hepática (CIH) desenvolve-se
a partir da alteração no fluxo biliar
tanto em hepatócitos quanto na árvore
biliar intra-hepática.
As
anormalidades clínicas e bioquímicas
associadas à CIH incluem a icterícia,
o prurido e a elevação das bilirrubinas,
fosfatase alcalina e ácidos biliares. Uma
variedade de doenças crônicas e agudas
produz esta síndrome clínica. A morbidade
e mortalidade são particularmente importantes
nas colestases crônicas, tais como a cirrose
biliar primária e a colangite esclerosante
primária.
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- FORMAÇÃO E EXCREÇÃO
DA BILE
Os
mecanismos e a regulação da secreção
biliar estão rompidos na CIH. Assim, uma
compreensão clara sobre a formação
da bile normal fornece uma base útil para
classificar a CIH como um processo, freqüentemente
multifatorial, que prejudica o fluxo biliar.
A
função dos hepatócitos, como
um epitélio polarizado que transporta ativamente
ácidos
biliares e outros solutos orgânicos e inorgânicos
a partir da superfície da membrana basolateral
(sinusoidal) para a membrana apical (canalicular),
é responsável pela formação
de um gradiente osmótico que direciona o
fluxo biliar. A integridade da barreira epitelial
é mantida pelas junções apertadas
dos hepatócitos, que vedam o espaço
paracelular separando o lume canalicular do sinusoidal
e delimitam as membranas basolateral e apical. Água
e cátions, tais como o Na+, contribuem para
o fluxo biliar, movendo-se através da membrana
canalicular e junções apertadas em
resposta aos gradientes osmótico e eletroquímico
criados pela secreção de ânions
impermeáveis.
O
estabelecimento e a manutenção da
polaridade epitelial é vital para que se
faça progredir a secreção biliar
no sentido correto. A localização
de proteínas de membrana transportadoras
específicas tanto na membrana apical ou basolateral,
assim como a organização de componentes
intracelulares para o transporte da bile a partir
do sinusóide para o canalículo biliar,
define a natureza polar dos hepatócitos.
As
junções apertadas e o citoesqueleto
agem conjuntamente para manter a polaridade epitelial.
As junções apertadas parecem fornecer
a barreira intramembrana, prevenindo a mistura de
algumas classes de proteínas transportadoras
de membrana entre os domínios basolateral
e canalicular. O citoesqueleto contribui para a
polaridade, ancorando algumas proteínas de
membrana para uma determinada região da membrana.
Também está envolvido em transportar
adequadamente proteínas transportadoras de
membrana recentemente sintetizadas para os seus
apropriados locais de ação. No hepatócito,
diferente de outras células epiteliais onde
o transporte direto de proteínas para o domínio
apical ocorre, todas as proteínas de transporte
de membrana sintetizadas recentemente para o canalículo
são separadas em grupos, primeiramente para
a membrana basolateral e depois para a membrana
apical.
2
- MECANISMOS DE COLESTASE
A
secreção da bile requer a completa
integração de um número de
eventos celulares, muitos aspectos dos quais estão
ainda pobremente compreendidos. Assim, em muitas
formas de CIH, os defeitos celulares iniciais são
desconhecidos.
A
despeito dessas limitações, é
possível definir um número de defeitos
celulares específicos que ocorrem na lesão
hepática colestática e classificar
muitas das CIH de acordo com um raciocínio
lógico. O conhecimento de como células
epiteliais estabelecem a sua polaridade, de como
os elementos do citoesqueleto funcionam e de como
estes mecanismos celulares são regulados,
também contribuem para um conhecimento do
mecanismo da secreção biliar normal
e de sua ruptura, e ajudam a estabelecer uma base
mais racional para a terapia de muitas doenças
colestáticas.
2.1.
Alterações estruturais e da função
das membranas basolateral (sinusoidal) e apical
(canalicular): colestase por estrógenos;
infusão de ácidos biliares colestáticos
em ratos (litocolato); colestase da gravidez; colestase
associada a nutrição parenteral total.
2.2.
Alterações do citoesqueleto.
2.2.1.
Microtúbulos (transporte vesicular transcitótico
diminuído): colchicina, etinilestradiol e
clorpromazina.
2.2.2.
Microfilamentos (diminuição das contrações
canaliculares e aumento da permeabilidade paracelular):
faloidina, citocalasina B; clorpromazina e andrógenos;
doença dos Byler e cirrose infantil dos índios
norte-americanos.
2.2.3.
Filamentos Intermediários (colapso canalicular):
níquel.
2.3.
Regulação da secreção
biliar.
2.3.1.
Aumento do cálcio intracelular (diminuição
do fluxo biliar): ácidos biliares colestáticos
(litocolato e taurolitocolato); cálcio ionóforo
A23187, vasopressina, colestase induzida por sepse
ou endotoxina, colestase induzida por linfocina.
2.3.2.
Ativação da cinase protéica
C (diminuição do fluxo biliar) e ativação
do AMP cíclico (aumento do fluxo biliar):
ésteres forbóis, dibutril CAMP.
2.4.
Aumento da permeabilidade paracelular (dissipação
de gradientes osmóticos ou eletromecânicos):
estrógenos, faloidina, clorpromazina, ligação
de ducto biliar, ácidos biliares mono-hidroxilados,
colestase da gravidez, contraceptivos orais, nutrição
parenteral total.
2.5. Polaridade celular alterada (perda do transporte
vetorial causada pela disfunção de
microtúbulos e alterações das
junções apertadas): colchicina, ligação
de ductos biliares e provavelmente isquemia.
2.6.
Perfusão alterada dos hepatócitos
(diminuição do transporte de oxigênio
e nutrientes para os hepatócitos; diminuição
da atividade de transporte de proteínas pela
membrana; disfunção de citoesqueleto,
aumento da permeabilidade paracelular e perda da
polaridade da célula): ésteres forbóis,
alfa-1 agonistas, clorpromazina, choque, insuficiência
cardíaca congestiva, vasoconstritores.
2.7.
Obstrução canalicular e de ductos
biliares intra-hepáticos (diminuição
do fluxo biliar causada pela precipitação
nos ductos biliares ou lesão imune dos ductos
biliares): ácidos biliares mono-hidroxilados,
protoporfíria, colestase induzida por drogas
(clorpromazina e tricíclicos), síndromes
do desaparecimento dos ductos biliares (ductopenia
idiopática), colangite esclerosante primária
e cirrose biliar primária, colangite auto-imune
(cirrose biliar primária antimitocôndria
negativo), sarcoidose, histiocitose X, doença
do enxerto versus hospedeiro, rejeição
do enxerto.
2.8.
Toxicidade dos sais biliares (diminuição
do transporte de proteína pela membrana,
aumento do cálcio intracelular ou da permeabilidade
paracelular, precipitação de ácidos
biliares dentro dos ductos): ácidos biliares
mono-hidroxilados, colestase recorrente intra-hepática.