ENDOSCOPIA
EM AÇÃO
Dr. Fauze Maluf Filho
- Serviço de Endoscopia Gastrointestinal
e Broncoesofagologia do Hospital das Clínicas da FMUSP
PUNÇÃO
DO PÂNCREAS GUIADA POR ECOENDOSCOPIA
A
ecoendoscopia, também conhecida como endossonografia ou ultrassonografia
endoscópica, foi introduzida em nosso meio no início da
década de 90. Através do acoplamento de pequena sonda
na extremidade distal do endoscópio, possibilita-se o estudo
sonográfico da parede do tubo digestório e estruturas
vizinhas, sob freqüências usualmente superiores àquelas
empregadas na ecografia convencional. Assim, sob 7,5 ou 12 MHz, observa-se
o desdobramento da parede intestinal em cinco camadas, bem como estruturas
vasculares, linfáticas e outras vísceras sólidas
relacionadas às diferentes porções digestórias.
Desde
sua introdução, logo se percebeu a alta acurácia
da ecoendoscopia na detecção de pequenas lesões
pancreáticas (Fig. 1), sólidas ou císticas, benignas
ou malignas. De fato, mesmo com o advento da ressonância magnética
e da tomografia helicoidal, a ecoendoscopia ainda é o método
mais acurado para o estudo do parênquima pancreático. Contudo,
a ecoendoscopia apresenta uma limitação comum à
maioria dos exames complementares por imagem, a saber, a impossibilidade
de caracterização histopatológica. Assim, frente
ao nódulo sólido pancreático, não se pode
fazer a distinção baseando-se apenas nos aspectos imagenológicos,
entre adenocarcinoma, lesão neuroendócrina, ou outras.
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Fig.
1 - Imagem de ecoendoscopia radial da cabeça pancreática,
revelando nódulo sólido arredondado, de limites
irregulares, medindo 14 x 16mm nos maiores eixos. |
Recentemente,
a ecoendoscopia deixou de ser exclusivamente método de diagnóstico
por imagem. Com o advento dos ecoendoscópios eletrônicos
setoriais, tornou-se possível a punção/biópsia
aspirativa com agulha fina, ecoguiada, de linfonodos, massas peridigestórias
e, obviamente, da glândula pancreática (Fig. 2). Esta última
foi descrita por VILMAN e cols. em 1992.
A sensibilidade e especificidade desta nova modalidade diagnóstica
têm variado de 64-90% a 85-100%, respectivamente (CHANG et al.,
1996; GRESS et al., 1996; BUTHANI et al., 1997), com índice de
complicação inferior a 2% (WIERSEMA et al., 1996).
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Fig.
2 - Lesão expansiva, sólida, na cabeça do
pâncreas. |
Poder-se-ia
argumentar contra a necessidade de punção ecoguiada em
pacientes portadores de lesões pancreáticas consideradas
irressecáveis pela ecoendoscopia, tomografia helicoidal ou angiografia.
No entanto, nem todas as massas pancreáticas são adenocarcinomas.
A possibilidade do diagnóstico de lesões sensíveis
a quimio ou radioterapia, tais como linfoma ou lesão neuroendócrina
não funcionante, justificam o método. Por outro lado,
protocolos de rádio e quimioterapia para adenocarcinoma do pâncreas
também exigem diagnóstico histológico. Também
pode ser a comprovação tecidual recomendável antes
da realização de cirurgia de grande porte quando um único
método, por exemplo a EE, detecta pequeno nódulo pancreático,
de tamanho inferior a 20mm, em paciente oligo ou assintomático.
Nossa
experiência com punção ecoguiada de pâncreas,
iniciada em julho de 2000, compreende 10 pacientes portadores de nódulos
sólidos pancreáticos. O valor global do método
ficou provado em 70% deles. Em dois enfermos, o caráter fibrótico
da lesão não permitiu a penetração da agulha.
Em um paciente a citologia foi inflamatória; contudo, o seguimento
demonstrou tratar-se de linfoma com invasão pancreática.
Destacam-se a característica ambulatorial do procedimento, realizado
sob sedação endovenosa, semelhante àquela empregada
na endoscopia digestiva alta convencional, e a ausência de complicações
a ele relacionadas.
O risco de semeadura
de células malignas durante a punção ecoguiada
não causa preocupação. Frente à doença
ressecável, o trajeto percorrido pela agulha será removido
com o espécimen operatório.
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Fig.
3 - Punção ecoguiada de nódulo sólido
em processo uncinado. Paciente feminina, de 72 anos, com queixa
de esteatorréia e emagrecimento de 7kg em 3 meses. A análise
do material revelou adenocarcinoma. No intra-operatório,
já havia carcinomatose peritoneal. |
Apesar da sensibilidade
ao redor de 80%, a punção ecoguiada do pâncreas
deixa de fornecer o diagnóstico de adenocarcinoma em número
expressivo de casos. É possível que o desempenho deste
método melhore com a detecção de mutação
do gene K-ras no tecido obtido. BETHÉLEMY et al. (2000) demostraram
ser possível a identificação destas alterações
genéticas no material obtido através de lavado das agulhas
de punção, mesmo em amostras necróticas. Deve-se
levar em conta a possibilidade da presença desta alteração
genética na pancreatite crônica (Van LAETHEM et al., 1998).
Os
fatos acima justificam o progressivo prestígio da punção
ecoguiada de estruturas peridigestivas, especialmente da glândula
pancreática.
Outras
aplicações da punção ecoguiada compreendem
a neurólise de plexo celíaco para tratamento da dor do
câncer pancreático (GUNARATNAM et al., 2000), bem como
a quimio ou a termodestruição de tumores da glândula,
estas duas últimas ainda em investigação. |