Cada
vez mais se torna comum aos clínicos atender
pacientes assintomáticos com enzimas hepáticas
elevadas e ultra-som de abdome sugerindo esteatose
hepática, através de exames de rotina
ou triagem em bancos de sangue.
Nos
Estados Unidos, uma pesquisa em Ambulatório
de Hepatologia apresenta a esteato-hepatite não
alcoólica (EHNA) como o terceiro diagnóstico
mais freqüente, superada apenas pela hepatopatia
alcoólica e hepatite crônica pelo vírus
C (Bacon, B. R. et al.).
Em
nosso meio, 10 de 40 (25%) dos doadores de sangue
(Fundação Pró-Sangue - Hemocentro
de São Paulo) apresentam elevação
crônica da alanina aminotransferase sérica
e, quando submetidos à biópsia hepática,
receberam-se portadores de EHNA.
O
número de casos de EHNA pode ser ainda maior
se considerarmos a possibilidade de muitos casos
de cirrose criptogênica terem sido originados
em uma esteato-hepatite.
O
conceito de esteatose hepática não
alcoólica compreende um amplo espectro de
lesões, que variam de esteatose focal leve a formas
com
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Hematoxilina-cosina:
esteatose macrovesicular, com focos de infiltrado
inflamatório predominantemente constituídos
de células polimorfonucleares em zona
III de Rappaport. Presença de corpúsculos
hialinos de Mallory, vacuolização
nuclear e hepatócitos balonizados. |
necrose,
em um processo que pode levar à cirrose.
A esteato-hepatite não alcoólica (EHNA),
nomenclatura utilizada pela primeira vez em 1980
por LUDWIG e cols., corresponde às hepatopatias
que cursam com sinais histológicos de agressão
inflamatória e deposição de
colágeno, num aspecto morfológico
indiferenciável da doença hepática
alcoólica, em indivíduos não
etilistas.
Diversos
outros termos, como hepatite pseudoalcoólica,
hepatite similar à alcoólica, hepatite
com esteatose, esteatonecrose e hepatite diabética,
foram utilizados em alusão a essa mesma hepatopatia.
Contudo, EHNA é o que se afirmou pela maior
aceitação no decorrer do tempo.
A
biópsia é fundamental ao diagnóstico
de EHNA porque os exames de imagem não são
capazes de detectar fibrose ou inflamação
hepática com fidedignidade. A esteatose predominante
é macrovesicular, com células inflamatórias
polimorfonucleares em região perivenular
e discreto infiltrado linfomononuclear portal. A
fibrose apresenta gradiente de quantidade de colágeno
maior junto à vênula hepática
terminal, reduzindo-se em direção
ao espaço-porta (LEE, 1998).
O
quadro clínico-laboratorial é quase
sempre pouco expressivo e inespecífico. Os
pacientes podem apresentar sintomas dispépticos,
dor em hipocôndrio direito e hepatomegalia.
Dentre as enzimas hepáticas, a alanina-aminotransferase
é a que se altera mais freqüentemente,
mas seu nível de elevação não
traduz o estadiamento da hepatopatia.
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Coloração
Tricrômio Masson: esteato-hepatite grau
4 (cirrose). Esteatose predominantemente macrovesicular,
com focos de atividade inflamatória e
disposição de colágeno
em região perivenular (zona III de Rappaport),
como também em região pericelular,
formando septos que delimitam nódulos
e poupam o espaço-porta. |
A
relação entre os níveis de
aspartato-aminotransferase e alanina-aminotransferase
(AST/ALT) é menor que dois, e freqüentemente
inferior a um, dado que é importante na diferenciação
da doença alcoólica.
A
EHNA é classicamente descrita em mulheres
na quinta ou sexta década de vida, em obesos,
diabéticos não insulino dependentes
e hiperlipidêmicos. Foi também descrita
na lipodistrofia, na abetalipoproteinemia, nas cirurgias
de 'bypass' jejunoileal e nas gastroplastias em
obesos, para perda de peso; na nutrição
parenteral, na derivação biliopancreática
e em enterectomias.
Drogas,
como glicocorticóides, hormônios estrogênicos
sintéticos em doses maciças, tamoxifeno,
amiodarona e, mais recentemente, substâncias
químicas por via inalatória, como
às que estão expostos profissionais
da indústria petroquímica, também
são referidas como causa de EHNA.
Mais
recentemente, alguns autores vêm observando
a ocorrência de EHNA em indivíduos
sem nenhum desses antecedentes, mas com níveis
de ferritina e saturação de ferro
elevados, pigmento de siderose em tecido hepático
e com mutação do gene HFE, da hemocromatose
hereditária. Os pacientes com essas características
apresentariam EHNA com características de
maior agressividade, ou seja, atividade necroinflamatória
e deposição de fibrose mais acentuada.
Até
o momento, o único tratamento eficaz descrito
consiste na perda de massa corpórea mediante
aumento da atividade física e dieta hipocalórica,
quando a EHNA está relacionada à obesidade.
Outras formas de tratamento, como antibioticoterapia
para esterilização da flora colônica,
ácido ursodeoxicólico, hipoglicemiantes
orais e antioxidantes vêm sendo propostos,
mas ainda aguardam esclarecimentos na literatura
científica em relação ao benefício
que representam.